Especialmente nos grandes centros urbanos, disseminou pelo país a construção de empreendimentos condominiais residenciais complexos e grandiosos, tanto pelo número de unidades condominiais quanto pela quantidade de lazer e serviços disponibilizados aos condôminos.
Como reflexo direito para gestão desses complexos, a utilização do síndico profissional e/ou a contratação de administradora capacitada passaram a ser consequências praticamente naturais e necessárias. E, ainda que não obrigatórias, são de extrema utilidade para atender realmente aos anseios dos condôminos em confronto com o memorial descritivo do que foi vendido.
Assim, muitas vezes, há o temor por parte dos proprietários de que ao transferir a gestão para o síndico e/ou administradora o poder de escolha de alguns tópicos deixarão de existir, por conseguinte, mesmo sendo proprietários terão que se aceitar algumas decisões contrárias aos anseios coletivos, especialmente, quando estamos lidando com empreendimentos recém implantados.
Para visualizar, podemos exemplificar uma situação rotineira em condomínios novos, que é a compra do enxoval, que são compostos por item de decoração, utensílios de limpeza e inúmeros outros itens, que vão desde uma simples lixeira até um complexo sistema de segurança.
Ora, a principio a escolha de todos os itens cabe ao síndico e/ou administradora, que deverá seguir o previsto na Convenção, como solicitação de orçamentos, confronto de tecnologia etc., porém, mesmo que bem elaborada, algumas escolhas podem ser realizadas sem a participação dos reais proprietários e maiores interessados, podendo ser algo simples, como a escolha da cor de uma lixeira, do cheiro de algum material de limpeza etc. Ou seja, mesmo existindo a compra de tudo que é previsto para funcionalidade do condomínio é comum que deixe de existir a escolha personalíssima para aquela comunidade condominial. E é por isso que muitos condomínios estão fazendo uso de Comissões de Moradores que, além de tornar uma administração mais compartilhada, quando possível, objetiva que as decisões atendam aos verdadeiros anseios dos proprietários e moradores.
Porém, para que uma Comissão de Moradores tenha validade indiscutível e suas decisões sejam cumpridas algumas observâncias devem ser cumpridas, senão vejamos:
a) Deve fazer parte da convocação assemblear à informação da instituição da Comissão, Comissão de Obra, Comissão de Revisão das Regras Condominiais, Comissão de Compra de Enxoval ou qualquer outra comissão temática;
b) É aconselhável que para cada comissão temática existam no mínimo três membros, seja definido – e contido em Ata – o objetivo final da Comissão e o prazo para conclusão dos trabalhos, por exemplo, se estivermos diante de uma Comissão que irá analisar a compra de enxoval é aconselhável que conste em Ata que o prazo para conclusão dos trabalhos será de “x” meses, a metodologia que será utilizada, se existirá a divulgação de relatórios ou informativos prévios, se serão realizadas reuniões abertas entre os membros da comissão com os demais condôminos para discutir o assunto etc.
c) Ficar estipulado que o trabalho da Comissão deverá ser acatado pelo Síndico, exceto se existir algum ato ilícito ou situação que viole as normas condominiais.
Assim, com a utilização da Comissão temática é possível que um grupo de pessoas se empenhe em encontrar soluções para casos específicos, e com maior dedicação e foco em um tema isolado o resultado é sempre proveitoso.
Porém, grande discussão é sobre a obrigatoriedade do síndico em cumprir o que for decidido pela Comissão. Isso porque, muitos entendem que isso retira a autonomia inerente ao cargo, porém, respeitando tais entendimentos, acredito que o cumprimento por parte do síndico não viola nenhuma autonomia funcional, pois apenas cumprirá o que foi decidido pela Assembléia que criou a Comissão com fins específicos. Lembrando-se sempre do poder da Assembléia na vida condominial.
Na pratica, isso quer dizer que, por exemplo, criada a Comissão para compra de enxoval, cujo orçamento tenha sido aprovado, após o trabalho da comissão, desde que demonstrado o confronto de três orçamentos dos itens a ser adquiridos e analisados e todos os demais dados, o síndico passa a ter apenas a função de executar a decisão, não podendo contrariar o resultado do trabalho, exceto em casos de gastos superfaturados, por isso, sua atuação será apenas como um revisor dos trabalhos, mas não poderá vetar o decidido sem justificativa concreta.
Ora, se a objetivo de uma Comissão é justamente retirar do síndico a exclusividade no poder de escolha do que os moradores entendem ser o melhor, não é crível lhe permitir recusar imotivadamente em executar o trabalho.
Veja, simbolicamente temos que, caso a Comissão defina que para o salão de festa será adquirida um modelo “X” de geladeira, e tendo realizado todas as tomadas de preço etc. não pode o síndico deixar de executar a compra do modelo “X” por entender que o modelo “Y” é melhor, afinal é dever do Síndico, nos moldes do art. 1.348 do CC, “IV – cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia;” (gn). Assim, a recusa no cumprimento da decisão da Comissão, devidamente criada em Assembléia, viola o dever legal do síndico.
Entretanto, situação totalmente oposta será se a recusa do síndico for motivada, por exemplo, se ao receber a conclusão dos trabalhos realizados pela Comissão, o síndico observar que a geladeira “X” deverá ser comprada na loja “Y” e ao confrontar os dados observar que o valor está acima do mercado, aí sim a compra deverá ser recusada em tal localidade, pois segundo o II do art. 1.348 do CC é dever do síndico “representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns;”(gn), ou seja, ao recusar a compra de um item, mesmo que aprovado pela Comissão exercerá seu dever legal de proteção dos interesses comuns do condomínio.
É por isso que a autonomia das decisões da Comissão formadas em Assembléias por moradores é alvo de inúmeras discussões, pois mesmo devendo ser respeitada pelo síndico, em caso de justificativa o mesmo não estará obrigado a executar o lá decidido. Ou seja, podemos dizer que a Comissão de Moradores, regularmente formada, possui uma autonomia relativa.
Dessa forma, como concreto temos que cabe ao síndico realizar a apuração do resultado do trabalho de Comissão e executar o lá decidido. No entanto, em caso de alguma situação que possa colocar em risco o Condomínio o correto é realizar os ajustes necessários para, em sendo o caso, colocar as decisões duvidosas para aprovação em Assembléia.
Conclui-se, portanto, que a Comissão de Morador, regularmente criada, possui poder de decidir o que deverá ser feito, cabendo ao síndico ofertar os meios necessários para sua execução, porém, se for encontrado situações prejudiciais ao condomínio a obrigatoriedade do síndico deixa de existir, mas deverá ser efetivamente justificada a recusa no não cumprimento da decisão da Comissão, ocasião em que caberá a Assembléia a votação e decisão final sobre a questão pendente.